11.3.07

Canto Por Elas

Nossa Senhora Desaparecida Entre As Grades By Alyne Costa, março de 2007

Quantas poetas vivem em mim?
Esta insana, religiosa, uma quase beata.
Outra Prost, embriagada e insensata.
Cachaceira, ébria, apaixonada...
Uma que faz versos em redondilhas...
Outra que faz hai-kais e chupa pastilhas.
Uma que faz versos de amor.
Outra: versos de terror.
Poemacabrinhos sobre novilhas, sereias e cabritas.
A alucinada que faz certidão e dá sua fé.
Ai, minha Fé!
Outra que só sobrevive após um café.
Uma que ri histérica, outra que somente acha graça.
Um que vai à boite, outra que senta na praça.
Uma traíra...
Outra Pomba Gira.
Uma seresteira, outra freira.
Uma soteropolitana, outra interiorana.
Uma que morre de raiva e outra que morre de rir
Uma que subiu aos céus
Outra que está por aqui
Uma: de credo e luz
Outra: sinal da cruz
Uma, lavadeira, outra, A Padroeira
Uma que cobra dívida
Outra que deve, não nega e paga quando pode.
Uma que se atreve.
Outra que se comove.
Uma que se cansou e deitou e dormiu.
Outra que mandou o mundo pra puta que o pariu.
Uma obscena, rebelde e sagaz.
Outra tímida, sublime e em paz.
Aquela que traz nos poros e no DNA
A espécie oprimida.
A espécie esquecida.
Todas as liras amordaçadas.
Todos os versos abortados nos porões de um:Cala-te, Mulher!
Todas elas habitam em mim.
Mudas, tristes, solitárias, abusadas, cansadas...
Todas elas me povoam as madrugadas.
Cantando seus tristes hinos.
Seus belos fados.
Suas cantorias.
Seus cânticos de carpideiras.
Seus repentes.
Todas elas de rodilha, levando água pra fonte.
As mais audaciosas criando um novo horizonte.
As mais resignadas, sofrendo, caladas.
Todas elas me habitam e me ressuscitam.
E um baile me levanta na escuridão.
Na bandeja: a cabeça e João.
Espécie mal interpretada, subjugada.
E na minha poesia; todas rainhas.
Deusas de ébano.
Caboclas.
Feiticeiras.
Em meu canto a força do grito oprimido.
O gozo, no prazer, no gemido.
E assim, fêmea, canto por todas.
Por todas que não podem cantar.

Alyne Costa
Brumado, 11 de março de 2007

Um comentário:

Braga e Poesia disse...

somos muitos e nenhum, somos todos e tão poucos, somo tudo e nada, somos apenas o que a nossa capacidade intelectual e sensorial permitem