15.2.07

Pra Moça Triste Que Nunca Casou


Quando entristeço minh’alma cora
Escrevo ora como muda, noutras santa
De certa forma algo me acalanta
Não sei os pássaros que visitam meu muro
Faltam plantinhas
Falta ainda aprender bordar toalhas de sonhos
Falta tanto da mulher que vive em mim
Quando alegreço, surto
Canto cantigas
Disparo a namorar
Faço viagens a reinos não fundados
Peregrino em mim
Em tanta dúvida e correnteza
E as palavras navegam em minha mente
Ela, a palavra me desmente
E rompo rótulos
Mas respeito traduções e rituais
Bruxa ou santa?
Doce ou seca?
Moça ou velha?
O espelho assusta:
Vou ficar uma coisa horrível.
E resolvo passear por Jerusalém
Meu Deus do céu para que tanta cruz?
Bonitos são os sagrados corações –
De Maria e de Jesus.
Coisa boa pra moça velha é passear de cruzeiro.
Coisa boa pra moça velha e preparar enxoval.
Ai começo a cuidar do meu:
Paninhos de ponto de cruz
Toalhas de richiliê...
Muito crochê, lençol branco com as iniciais bordadas.
E começo a trezena de Santo Antônio.
Peço um moço pálido, sem cicatriz.
Um moço sabido e que saiba tocar piano.
Um moço de anel.
E penso nas flores, nas crianças indo ao jardim de infância...
Nas visitas em casa, nas xícaras de café.
Ai me imagino, meu Deus...
Meu delírio é a vapor.
Isso é canto pra moça que nunca casou.
Marido bom a gente inventa.

Alyne Costa

Brumado, 15 de fevereiro de 2007

14.2.07

A Vida

The Dream, Matisse, 1940


Meu gato senta em meu colo e sussurra:
-A vida é curta...
O barulho da motocicleta sugere:
-A vida é ritmo...
O japonês do balcão segreda:
-A vida é lânguida.
No velho rádio Gonzaguinha ainda canta:
“O que é o que é, meu irmão?”
A amiga obstinada chora:
-A vida é o choro do filho que eu não pari!
O irmão diz:
-Relaxe...
O poema de Drummond decreta:
“-A vida é breve e o amor mais breve ainda.”
Mas meu coração...
Ai, esse tolo, sem assunto, sem atenção, grita aos meus ouvidos:
A vida é ele!
Alyne Costa
Brumado, 14 de fevereiro de 2007

8.2.07

Para Todos Os Meus Namorados


Para todos meus namorados malvados:
Obrigada, viraram poesia...
Para os que se tornaram amigos:
Obrigada, viraram poesia...
Para os que se arrependeram:
Obrigada, viraram poesia...
Para os que falam mal:
Mais sensibilidade.
Para os tímidos:
Mais atrevimento.
Para os que se julagaram enganadores:
Mais inteligência.
Para os já casados:
Paciência.
Para os separados:
Prudência.
Para o ex mais recente:
A dúvida latente.
Um e-mail antes de escovar os dentes...
Para o atual:
A força do sol.
A posição de yoga.
O bumba-meu-boi de enfeite nada...
A presença quando fechar os olhos.
Os versos que ainda não nasceram...
O cheiro no travesseiro.
A esteira na sala, a folhinha na cozinha.
O beijo de chuveiro e uma vontade enorme de aprender fazer peixe.
Este homem que me ama enquanto ausente...
Este homem que me protege à distância...
Que me pega no colo.
Que me renasce criança.
Por ele eu aprenderia a cozer.
Coisinhas que mulher moderna tem medo de aprender.
Por ele minhas sagradas horas de preguiças.
Todas as minhas manhas e malícias.
Para todos que foram: Um cheiro.
Para ele: Amor o ano inteiro....


Alyne Costa
Brumado, 8 de fevereiro de 2007